O Kosovo situa-se a sudoeste da Sérvia,
encaixado entre a Albânia, o Montenegro, a Sérvia e a Macedônia. É uma região
montanhosa com os vales de Kosovo a Norte, Metohija (Kosmet) a Oeste, Gnjilane
a Este, Malo Kosovo a Nordeste e Drenica no centro. A população do Kosovo, kosovars, é majoritáriamente albanesa
(90%). Os albaneses consideram-se descendentes dos povos balcânicos
pré-românicos, os Ilírios e em particular os Dardanianos, que antes da ocupação
romana habitavam as regiões da Albânia, Kosovo e Oeste da Macedônia.
No século XII os
Sérvios vindos do Norte ocupam a região hoje conhecida por Kosovo. Em 28 de
Junho de 1389, em Kosovo Poljie (Campo
dos Melros) o exército sérvio do Príncipe Lazar enfrentou os turcos otomanos na
Batalha de Kosovo. O exército sérvio foi derrotado e o Príncipe Lazar, morto. A
região foi ocupada pelos otomanos. Os albaneses convertem-se em larga escala ao
islamismo, por outro lado os sérvios mais resistentes são perseguidos e muitos
acabam por emigrar para o Norte (Vojvodina, Krajinas).
A Batalha do Kosovo é um marco
histórico e mítico para a nação sérvia e a sua data constitui o dia nacional da
Sérvia. A derrota marcou o inicio da decadência do Reino dos Sérvios que em
1459 seria submetido ao Império Otomano. Os albaneses islamizados assumem
lugares privilegiados na administração otomana, e como tal considerados aliados
dos turcos.
A Sérvia só volta a recuperar o Kosovo
no final das guerras balcânicas (1912-1913). O Kosovo faz parte do Reino dos
Sérvios, Croatas e Eslovenos. Durante a II Guerra foi anexado à Albânia ocupada
pelos italianos. Com o final da II Guerra o Kosovo passou a integrar a
Iugoslávia Socialista de Tito, como parte da República da Sérvia.
Tito lidou sempre com habilidade e
"mão de ferro" com os nacionalismos eslavos. Em relação ao Kosovo, e
de forma a acalmar a população albanesa (majoritária no Kosovo, mas minoritária
no âmbito da Sérvia ou da Iugoslávia) e simultaneamente amputar o nacionalismo
sérvio de um dos seus símbolos mais fortes, foi dando progressivamente
autonomia à região. A esta política não foi estranha a ambição de Tito de
juntar a Albânia à própria federação iugoslava.
A Constituição Iugoslava de 1946 criou
a Região Autônoma do Kosovo-Metohija, posteriormente a Constituição de 1974 criou
a Província Autônoma do Kosovo (ao mesmo tempo foi criada a Província Autônoma
da Vojvodina), com governo e parlamento próprios. As Províncias Autônomas possuem
assento na presidência coletiva da Federação Iugoslava.
Slobodan Milosevic, líder dos
comunistas sérvios assumiu a defesa do nacionalismo sérvio e em 1989, com a
anuência dos comunistas do Kosovo e da Vojvodina faz alterar a Constituição da
Sérvia e retirou a autonomia das províncias. O Kosovo passou a ser objeto de
medidas discriminatórias dos albaneses e viveu sob um clima de tensão e
conflito.
Em 22 de Setembro de 1991, num
referendo clandestino, os kosovares pronunciaram-se a favor da independência. A
independência, no entanto não foi reconhecida internacionalmente. Em 24 de Maio
de 1992, em eleições não oficiais a maioria albanesa do Kosovo elegeu
presidente o escritor Ibrahim Rugova, líder da Liga Democrática do Kosovo
(LDK).
Rugova e a LDK seguiram uma política
moderada e evitaram o confronto com os sérvios. Rugova defendia inicialmente a
continuação na Iugoslávia, mas com o estatuto de república. Os kosovares criaram uma autêntica
sociedade paralela, com as suas escolas e instituições independentes das do
governo sérvio. Esta resistência passiva evitou os confrontos mas não levou a
nenhuma solução.
A difícil situação
econômica da Sérvia, objeto de várias sanções da comunidade internacional pela
sua intervenção no conflito da Bósnia, faz-se sentir duramente na região do
Kosovo-Metohija (designação oficial sérvia do Kosovo) desde há muito a região
mais pobre da república. A crescente discriminação e perseguição da comunidade
albanesa majoritária na região faz crescer o descontentamento e aumentou as
fileiras dos nacionalistas albaneses. Forças nacionalistas como o Exército de
Libertação do Kosovo - UÇK (Ushtria Çlirimtare e Kosovës) defendiam
a ruptura com a Iugoslávia, e a união com a Albânia.
As primeiras ações do UÇK foram
efetuadas em 1992 na Macedônia. Em 1995 iniciaram as primeiras ações armadas
contra esquadras de polícia no Kosovo e em Junho de 1996 surgiram pela primeira
vez em público. O
tipo de atuação do UÇK valeu-lhe ser classificado pelas autoridades de
Belgrado, desde logo, de "grupo terrorista". O UÇK era constituído
por vários grupos com uma atuação, até recentemente, pouco coordenada, para
além da reivindicação à independência, não existia um suporte ideológico
definido e os seus lideres mais conhecidos tinham várias divergências entre si.
A situação no Kosovo começou a
agravar-se após os Acordos de Dayton para a Bósnia-Herzegovina. A população de
etnia albanesa faz sentir o seu descontentamento por a "Questão do
Kosovo" não ser contemplada nos acordos. O Kosovo com uma das taxas de
natalidade mais altas da Europa, em particular na população de etnia albanesa,
tem igualmente uma taxa de desemprego que ronda os 70%.
A situação torna-se ainda mais violenta
e no inicio de 1998 a
polícia especial sérvia desencadeou ações militares contra os bastiões do UÇK
nas regiões de Drenica e da capital, Pristina. Os Estados Unidos, a
Grã-Bretanha, a França, a Itália e a Rússia constituíram um Grupo de Contato no
sentido de procurar a obtenção de uma saída pacífica para o conflito. Em Março
de 1998 as Nações Unidas, através da Resolução 1160 do Conselho de Segurança
condenaram a utilização da violência no Kosovo. O Grupo de Contato propôs o fim
das hostilidades, o regresso de refugiados, a retirada das forças militares
sérvias e a monitorização por observadores internacionais. Após complicadas
negociações e pressão dos países da OTAN, o embaixador Richard Holbrooke obteve
da Iugoslávia um acordo sobre a aceitação de uma missão de observadores da OSCE. Em 25 de outubro de 1998, com a
aprovação das Nações Unidas (Resolução 1203), foi estabelecida a Kosovo
Verification Mission (KVM).
Apesar dos esforços da KVM a situação continuou muito
tensa com várias ações levadas a cabo pelos elementos do UÇK e da policia
sérvia. A escalada da violência atingiu o seu auge em Janeiro de 1999, com um
alegado massacre de civis albaneses na povoação de Racak, no Kosovo.
Com grande custo o Grupo de Contato
conseguiu juntar todas as partes à mesa de conversações em Rambouillet - França
(7 a 17 de
fevereiro de 1999). As negociações levaram à preparação de um texto de acordo
que, genéricamente, previa a autonomia do Kosovo, a sua desmilitarização e o
estabelecimento de uma força de manutenção da paz com militares da OTAN. A
proposta de acordo não agradou totalmente às partes em conflito, mas acabou por
ser assinada pelos representantes albaneses do Kosovo, e recusada pela
Iugoslávia, nomeadamente nos pontos que implicavam a saída das suas forças
militares e o estabelecimento de uma força de manutenção de paz.
A OTAN, cedendo a pressões de
Washington, continuou com a política de pressão já iniciada no final de 1998,
ameaçando desencadear ataques aéreos, caso a Iugoslávia se recusasse a assinar
o plano de paz de Rambouillet. A Iugoslávia foi intransigente e pelo contrário
deslocava mais forças e continuou as operações militares no Kosovo.
Em 22 de março o Conselho do Atlântico
Norte (NAC) autorizou o Secretário Geral da OTAN, Javier Solana, a desencadear
os ataques aéreos sobre a Iugoslávia e dois dias depois se iniciou a operação Allied Force (24 de março). Tomaram
parte na operação 13 países da OTAN. Em resposta aos bombardeamentos as forças
sérvias intensificaram as operações no Kosovo, e iniciaram uma
"limpeza" sistemática da população albanesa do Kosovo. Os refugiados
chegaram aos milhares às fronteiras da Albânia, Macedônia e Montenegro,
constituindo o maior desastre humanitário na Europa desde o final da II Guerra
Mundial.
Javier Solana foi um dirigente
histórico do Partido Socialista Espanhol (PSOE), e contou, para essa guerra,
com o apoio principal de Gehard Schöder, Lionel Jospin, Massimo d’Alema e
Anthony Blair, então respectivamente chefes dos Governos da Alemanha, da
França, da Itália e do Reino Unido e membros eminentes, todos os quatro da
social democracia européia. Todos aceitaram, para sair do impasse das
negociações de paz em Rambouillet, a via militar proposta por Washington como
“solução única”, ao passo que todos sabiam que o recurso à OTAN e os
bombardeios da Sérvia acarretariam a morte de muitos civis inocentes e a
destruição de todo um país, sem com isso evitar a extensão dos conflitos nas
Balcãns, como provou a guerra da Macedônia em 2001.
O governo americano aproveitou a Guerra do Kosovo para
mudar o foco da opinião pública sobre o caso interno do presidente Clinton com
a ex-estagiária Mônica Lewinsky. Em pouco tempo, a mídia dos Estados Unidos
veiculou a campanha militar da OTAN, liderada pela América, cuja falsa missão
era a de libertar a população albanesa de um ditador. A popularidade de Clinton
permaneceu em alta, contrariando, assim, os interesses dos Republicanos.
Do livro:
O Longo Caminho até o 11 de Setembro
Nenhum comentário:
Postar um comentário